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  • Vera Cristina

#dia 17 - Minha vida antiga: onde foi parar?

Acordo e quase mecanicamente vou para o banheiro. Só realmente desperto debaixo do chuveiro.

60 anos. Ontem, acordaria lépida, mal me vestiria e iria fazer ginástica. Café da manhã correndo na lanchonete da academia, assistir aula na facul ainda de legging e blusinha. Mas isto foi ontem, aos 19 anos. Hoje, é diferente. Meus dias entre ontem e hoje já foram muito variados—namoro, casamento, vida de recém casada em Genebra, vida com filhos pequenos em São Paulo, casa, grupo de mulheres, filhos saindo de casa e, agora, isto, uma vida forçada dentro de casa. E 60 anos! Tudo isto caiu junto com as gotas do chuveiro e lavaram meu corpo, meus sentimentos e meus pensamentos ...

Saio do chuveiro. A porta do apartamento se abre e fecha. Passos no corredor; batem na porta do banheiro. Abro e nem tenho tempo de pensar e já disparo;

- Peloamordedeus, sapato que usou na rua fica no hall do apartamento, Pedro, não sabe ainda?!

E só depois vejo o buquê de astroméria, minha flor preferida, estendido em minha direção. O sorriso por detrás da máscara, denunciado pelo franzir dos olhos, e a frase desajeitada:

- Feliz aniversário, Amelinha!

Nossos olhares vão para as flores e ele, dando-se conta do momento, pergunta, quase se desculpando:

- Flor também se higieniza, Amelinha?

E me dou conta de que não é fácil fazer 60 anos nesta pandemia ...



Fotos: chuveiro (fonte: Getty Images); buquê de flores (fonte: floresonline.com)

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