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  • Vera Cristina

Isto não é um diário

Tem um silêncio aqui.

Uma falta de escrita.

Uma pausa.


Não foi um tempo de quietude, marasmo, ao contrário, muitas outras coisas aconteceram.

Mas, neste canto de mim, tudo estava quieto.

Me lembrou dos movimentos da respiração no Yoga –

inspira, enchendo os pulmões de ar,

expira, deixando o ar sair,

mas, entre cada um desses movimentos, há uma pausa: pulmões cheios / pulmões vazios. O movimento mais rico interiormente é quando o pulmão está vazio. Vazia, a mente. Abrindo espaço para o novo. Novo ar, novos ares, novos pensares e sentires. Assim mesmo, no plural!


E assim é que a escritora saiu de cena e vieram Caixas de Experiências, com desafios e novas propostas para olhar para dentro, e veio a bióloga, a olhar seus minúsculos seres, tentando descobrir seus nomes, e veio a dona-de-casa, a pensar e procurar receitas para a ceia natalina, a preparar o presépio e a Coroa do Advento. E veio o desafio de fazer pão semanalmente, de forma metódica e seguindo protocolos, buscando aperfeiçoar-se nesse trabalho artífice.


Era muito ar a ocupar o pulmão e aquele alvéolo da escrita de si, escrita afetuosa, ficou com o arzinho de novembro.

Do mesmo modo como não conseguimos manter nossos pulmões apenas cheios ou totalmente vazios, esse espaço de escrita reclamou por movimento e eis que uma ideia vem, o caderno sai da estante e o lápis, do estojo. “Mise-en-place” se diz na culinária quando separamos e preparamos os ingredientes para serem usados em uma receita – cebola picada, alho amassado, temperos separados, panela no fogo.

E como ao final do período do pulmão vazio, em que o ar ao entrar traz alívio e expansão, a cebola ao caramelizar-se perfuma a cozinha, as palavras ao serem escritas no papel produzem um encontro —eu, meus sentimentos, minhas ideias, reflexões, sua leitura, sua percepção, vibração e ressonância.

Sim, estou falando de você que lê estas palavras. Estou falando com você, para você.


Isto não é um diário. Esta é a minha pipa que lancei ao céu, na esperança de ser vista e que alguém se encante com ela. E, ao encantar-se, solte também a sua. Que eu verei, ou não.


O vento de dezembro sopra movendo nuvens de chuva, balança minhas “bandeirinhas de oração” trazidas do Nepal, faz cantar a árvore do meu quintal movendo suas folhas.

Leve minha pipa para o alto, vento amigo dezembrino!

26.xii.2020




Figuras: Pipa (Klara Kulikova) e bandeirinhas (Siriwan Srisuwan), fonte: Unsplash

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